Idade de ouro islâmica

A Idade de ouro islâmica, também conhecida como Renascimento islâmico[1] é datada comumente entre os séculos VIII e XIII,[2] embora alguns a estendam até ao século XIV ou XV.[3] Durante esse período, engenheiros, acadêmicos e comerciantes do mundo islâmico contribuíram grandemente em áreas como artes, agricultura, economia, indústria, literatura, navegação, filosofia, ciências, e tecnologia, preservando e melhorando o legado clássico, por um lado, e acrescentando novas invenções e inovações próprias.[4] Os filósofos, poetas, artistas, cientistas, comerciantes e artesãos muçulmanos criaram uma cultura única que influenciou as sociedades de todos os continentes.[4]

Fundamentos

Era dos Califas:
  Expansão durante a época de Maomé, 622-632
  Expansão durante o Califado Ortodoxo, 632-661
  Expansão durante o Califado Omíada, 661-750

Durante as conquistas muçulmanas dos séculos VII e VIII, exércitos de nômades árabes se estabeleceram no Império islâmico, o maior império que o mundo havia conhecido até o momento (início da Idade Média). A «idade de ouro do Islã» começou pouco depois, em meados do século VIII, com a ascensão do poder dos califas abássidas e a transferência da capital do Império de Damasco para Bagdá.[5] Os Abássidas foram influenciados pelos preceitos do Alcorão e das tradições do Hadiz, cujos valores se expressam em frases como: "A tinta dos cientistas vale tanto quanto o sangue dos mártires", de onde se evidencia o valor do conhecimento.[5] Durante esse período, o mundo muçulmano se converteu no centro intelectual indiscutível da ciência, filosofia, medicina e educação, enquanto que os abássidas lideravam a causa do conhecimento e se estabeleciam na "Casa da Sabedoria" em Bagdá, onde estudiosos muçulmanos e não-muçulmanos tentaram reunir e traduzir todo o conhecimento mundial para a língua árabe.[5] Muitos livros da Antiguidade Clássica, que de outra forma poderiam ter sido perdidos, foram traduzidos para o árabe. Do árabe essas obras foram, posteriormente, traduzidas para o turco, persa, hebreu e latim.[5] Durante esse período, o mundo islâmico foi um caldeirão de culturas que coletadas e sintetizadas, avançou significativamente o conhecimento herdado das culturas da China Antiga, da Índia, da Pérsia, do Egito, do Norte da África, da Grécia Clássica e do Império Bizantino.[5] Dinastias rivais da abássida, como a fatímida do Egito e a omíada do Al-Andalus, também criaram centros intelectuais em cidades como Cairo e Córdoba, que rivalizavam com Bagdá.[5]

Uma das maiores inovações desse período foi o papel; originalmente um segredo guardado com zelo pelos chineses da dinastia Han.[6] A arte da confecção do papel foi obtido a partir de prisioneiros capturados na Batalha de Talas (751), o que resultou na construção de fábricas de papel em Samarcanda e Bagdá.[6] Os árabes melhoraram a técnica chinesa utilizando a casca de amoreira e amido. Os muçulmanos se diferenciavam também no uso da pena em contraste com o costume chinês de usar o pincel.[6] No ano 900, existiam centenas de estabelecimentos que empregavam escribas e encadernadores de livros em Bagdá, e começaram a se estabelecer as primeiras bibliotecas públicas,[6] incluindo as primeiras do mundo a emprestarem livros. A partir dali, o uso do papel propagou-se ao Oeste, a Fez e dali ao Al-Andalus, de onde seria exportado à Europa no século XIII.[6]

Grande parte destes ensinamentos em desenvolvimento se interconectam com a geografia. Mesmo antes da presença islâmica, a cidade de Meca servia como centro comercial na Arábia. A tradição de peregrinação à Meca transformou-a num centro de intercâmbio de ideias e mercadorias. A influência dos comerciantes muçulmanos no comércio entre a Arábia e a África e a Ásia foi muito grande, fazendo com que a civilização islâmica se desenvolvesse sobre uma base mercantil, contrastando com os cristãos, indianos e chineses, que construíram suas sociedades a partir de uma nobreza cujo poder estava fundado na posse de terras e produção agrícola. Os comerciantes muçulmanos levaram suas mercadorias e sua fé à China e Índia (que atualmente tem 230 milhões de muçulmanos) e aos reinos da África Oriental, regressando destes países com novas invenções. Os comerciantes usaram sua riqueza para melhorar a produção têxtil e agrícola.

Da mesma maneira que os comerciantes, os missionários sufistas também tiveram um papel destacado na difusão do Islã, levando sua mensagem a várias regiões do mundo. Estas incluem a Pérsia, a antiga Mesopotâmia, a Ásia Central e o Norte da África. O misticismo sufista teve também influência em partes da África Oriental, Anatólia (atual Turquia), sudeste e sul da Ásia.[7][8]

Humanismo

Muitos pensadores muçulmanos da Idade Média seguiam o humanismo, o racionalismo e o discurso científico na busca de conhecimento, significados e valores. Um amplo espectro de escritos islâmicos sobre a poesia amorosa, a história e a teologia filosófica mostram que o pensamento medieval islâmico estava aberto às ideias humanistas do individualismo, secularismo, ceticismo e liberalismo.[9][10]

A liberdade religiosa ajudou a criar redes interculturais atraindo assim intelectuais muçulmanos, cristãos e judeus — desse modo a "plantar a semente" do maior período de criatividade filosófica da Idade Média, a partir do século VIII ao XIII.[5]

O ensino superior e as instituições científicas

Um número significativo de instituições previamente desconhecidas na Idade Antiga, teve a sua origem no mundo medieval islâmico, sendo os exemplos mais notáveis o hospital público (que substituiu os templos de cura), a biblioteca pública, a universidade para graduados e o observatório astronômico como instituto de investigação (mais do que um local simples).[11]

As primeiras universidades que possuíam graduação eram os bimaristões — hospitais médicos universitários do mundo medieval islâmico, que entregavam diplomas de medicina a estudantes de medicina islâmica que estavam qualificados para exercer como doutores em medicina a partir do século IX. Sir John Bagot Blugg escreveu a respeito:[12]

"Nos tempos de Almamune, as escolas de medicina eram extremamente ativas em Bagdá. O primeiro hospital público gratuito foi aberto em Bagdá durante o califado de Harune Arraxide. Ao desenvolver este sistema, médicos e cirurgiões eram obrigados a dar aulas nas escolas de medicina, e entregavam diplomas a aqueles que consideravam qualificados para exercer a medicina. O primeiro hospital no Egito foi aberto em 872, e a partir daí se espalhou por todo o Império, desde o Al-Andalus (Península Ibérica) até à Pérsia (Irã)."
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O Livro Guinness dos Recordes reconhece a Universidade de Al Karaouine, em Fez (Marrocos), fundada no ano 859, como a universidade mais antiga do mundo.[13] A Universidade Al-Azhar, fundada no Cairo (Egito) no século X, oferecia uma ampla variedade de graduações acadêmicas, incluindo estudos de pós-graduação, e é considerada frequentemente a primeira universidade global.

Notas e referências

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