Prémio Camões

atribuído a autores que tenham contribuído para o enriquecimento do património literário
 Nota: Para outros significados, veja Camões (desambiguação).

O Prémio Camões (português europeu) ou Prêmio Camões (português brasileiro) é um prémio literário instituído pelos Governos de Portugal e do Brasil em 1988 com vista a estreitar os laços culturais entre os vários países lusófonos e enriquecer o património literário e cultural da Língua Portuguesa. Atribuído anualmente desde 1989, é o maior galardão outorgado no âmbito da Literatura em Língua Portuguesa. O nome do prémio é uma homenagem ao poeta português Luís Vaz de Camões, o maior escritor da História da Língua Portuguesa.

Prémio Camões
Prémio Camões
DescriçãoPrémio pelo enriquecimento do património literário e cultural da Língua Portuguesa
OrganizaçãoDGLAB e FBN[1][2]
PaísPaíses Lusófonos
Primeira cerimónia1989
Detentor atualJoão Barrento
ApresentaçãoJúri internacional

É atribuído aos autores, pelo conjunto da obra, que contribuíram para o enriquecimento do património literário e cultural da Língua Portuguesa. O valor monetário do prémio é presentemente de 100 000€, um dos mais elevados a nível mundial entre os prémios literários.[3][4]. Este valor é concedido ao premiado por meio de subsídio do Governo de Portugal e da Fundação Biblioteca Nacional do Brasil.

O Ministério da Cultura português, através da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB), com a colaboração do Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais, organiza pela parte portuguesa a atribuição do Prémio desde a sua instituição. Cabe à Fundação Biblioteca Nacional (FBN) do Brasil a organização pela parte brasileira.[1][2] O diploma entregue aos laureados contém o nome de todos os países lusófonos e é assinado pelos Chefes de Estado de Portugal e do Brasil.[5]

Entre os 34 laureados encontram-se autores de 5 países lusófonos. O presente detentor do prémio é Silviano Santiago, escritor brasileiro.

História

Instituição

Luís Vaz de Camões

Este prémio é considerado o mais importante da Literatura a premiar um autor de Língua Portuguesa pelo conjunto da sua obra. Destina-se a autores de Língua Portuguesa, qualquer que seja a sua nacionalidade.[6]

O Prémio Camões é atribuído anualmente por um júri especialmente constituído para o efeito. O prémio consiste numa quantia pecuniária resultante das contribuições dos dois Estados, fixada anualmente de comum acordo. Presentemente o valor monetário do prémio é de 100 000€.

O Prémio Camões foi instituído inicialmente pelo Protocolo Adicional ao Acordo Cultural entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, de 7 de Setembro de 1966, que cria o Prémio Camões, assinado em Brasília, em 22 de Junho de 1988, aprovado por Portugal através do Decreto n.º 43/88, de 30 de Novembro.[7]

Este protocolo foi substituído pelo Protocolo Modificativo do Protocolo Que Institui o Prémio Camões, celebrado entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, assinado em Lisboa, em 17 de abril de 1999, aprovado por Portugal, através do Decreto n.º 47/99, de 5 de Novembro.[8] Segundo o protocolo, está previsto o acompanhamento por uma comissão paritária, com representantes de ambas as partes, cabendo-lhe definir objectivos, avaliar as actividades desenvolvidas e resolver eventuais dificuldades relacionadas com o mesmo.[9]

Quaisquer instituições de natureza e vocação cultural de países lusófonos poderão apresentar candidaturas no ano anterior àquele em que o Prémio vai ser atribuído. O júri não está vinculado pelas candidaturas apresentadas. O prémio não pode ser outorgado a mais do que uma personalidade em cada ano nem pode deixar de ser atribuído.[10]

Júri

O júri é constituído por 6 membros, cujo mandato é de 2 anos. Os Governos de Portugal e do Brasil designam 2 membros cada, sendo os 2 membros restantes designados de comum acordo de entre personalidades dos restantes países lusófonos. Assim sendo, é um dos raros prêmios literários que busca representar toda a comunidade de países lusófonos em seu corpo de jurados, assim como ocorre com o Prêmio Oceanos e o Prémio Internacional Pena de Ouro.

PaísJúri
Portugal2 membros
Brasil2 membros
Angola
Cabo Verde
Guiné-Bissau
Moçambique
São Tomé e Príncipe
Timor-Leste
2 membros

Laureados

AnoRetratoLaureadoVidaPaísObraRef
1989 Miguel Torga1907–1995 Portugalpoesia, conto, romance, teatro, novela, memórias, ensaio[11]
1990 João Cabral de Melo Neto1920–1999 Brasilpoesia, ensaio[12]
1991José Craveirinha1922–2003  Moçambiquepoesia[13]
1992Vergílio Ferreira1916–1996  Portugalromance, conto, memórias, ensaio[13]
1993 Rachel de Queiroz1910–2003  Brasilromance, crónica, tradução, teatro, memórias[13]
1994 Jorge Amado1912–2001  Brasilromance, crónica, novela, poesia, biografia, memórias[13]
1995 José Saramago1922–2010  Portugalromance, crónica, conto, novela, poesia, memórias[13]
1996 Eduardo Lourenço1923–2020  Portugalensaio, filosofia, crítica literária, estudos literários[13]
1997 Pepetela
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos
1941 (82 anos)  Angolaromance, teatro[13]
1998 Antonio Candido1918–2017  Brasilcrítica literária, estudos literários, ensaio, sociologia[13]
1999 Sophia de Mello Breyner Andresen1919–2004  Portugalpoesia, conto, teatro, tradução, ensaio[13]
2000 Autran Dourado1926–2012  Brasilromance, conto, ensaio, memórias[13]
2001 Eugénio de Andrade1923–2005  Portugalpoesia, tradução, crónica[13]
2002 Maria Velho da Costa1938–2020  Portugalromance, conto, teatro, ensaio[13]
2003Rubem Fonseca1925–2020  Brasilromance, conto, crónica, novela[13]
2004Agustina Bessa-Luís1922–2019  Portugalromance, novela, conto, crónica, teatro, ensaio, biografia, memórias[13]
2005 Lygia Fagundes Telles1923–2022  Brasilromance, conto[13]
2006José Luandino Vieira
(recusou)
1935 (88 anos)  Portugal
 Angola
romance, conto, novela[14]
2007 António Lobo Antunes1942 (81 anos)  Portugalromance, crónica[13]
2008 João Ubaldo Ribeiro1941–2014  Brasilromance, conto, crónica, novela, ensaio[13]
2009 Arménio Vieira1941 (83 anos) Cabo Verdepoesia, ensaio[13]
2010 Ferreira Gullar1930–2016  Brasilpoesia, conto, crónica, ensaio, crítica de arte, biografia[13]
2011Manuel António Pina1943–2012  Portugalpoesia[15]
2012Dalton Trevisan1925 (98 anos)  Brasilconto, romance, novela[16]
2013 Mia Couto1955 (68 anos)  Moçambiqueromance, novela, conto, poesia[17]
2014 Alberto da Costa e Silva1931–2023  Brasilhistória, poesia, memórias, ensaio, biografia[18]
2015Hélia Correia1949 (75 anos)  Portugalromance, poesia, teatro, conto[19]
2016 Raduan Nassar1935 (88 anos)  Brasilromance, novela, conto[20]
2017 Manuel Alegre1936 (87 anos)  Portugalpoesia, romance, novela, conto[21]
2018 Germano Almeida1945 (79 anos) Cabo Verderomance, conto, crónica[22]
2019 Chico Buarque1944 (79 anos)  Brasilromance, poesia, música, teatro[23]
2020Vítor Manuel de Aguiar e Silva1939–2022  Portugalensaio, estudos literários[24]
2021 Paulina Chiziane1955 (68 anos)  Moçambiqueromance[25]
2022 Silviano Santiago1936 (87 anos)  Brasilromance, ensaio, crítica literária[26]
2023João Barrento1940 (84 anos)  Portugalensaio, estudos literários, crónica, tradução[27]

Palmarés por país

PaísLaureados1.ª Outorga
Portugal151989
Brasil141990
Moçambique31991
Angola21997
Cabo Verde22009

Reconhecimento e crítica

Num artigo publicado no ano 2000 Jorge Henrique Bastos assinalou que, embora o prémio tenha sido concedido a "vários autores incontornáveis" da literatura lusófona, a predominância de vencedores portugueses e brasileiros contrastava com a baixa quantidade de escritores africanos. Referindo-se à produção literária dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, o autor assinalou que a diferença poderia ser explicada "pelo facto destas literatura (sic) serem ainda jovens, e muitas das obras estão ainda em curso para se inserir nos pressupostos que norteiam a atribuição do prémio".[28] Até então, apenas dois autores africanos haviam sido premiados. Atualmente são seis em 32.

A escolha da escritora brasileira Rachel de Queiroz, em 1993, gerou polémica. Segundo uma reportagem assinada por Norma Couri veiculada no Jornal do Brasil, os membros portugueses do júri ficaram desconfortáveis com o fato de que os representantes brasileiros - Arnaldo Niskier, Oscar Dias Correia e João de Scantimburgo - chegaram a Lisboa com o nome da escritora previamente escolhido. Os portugueses procuraram sugerir outras opções, como Jorge Amado e Haroldo de Campos, porém, não obtiveram sucesso em mudar a opinião dos votantes brasileiros. Ainda segundo a reportagem, Niskier, Correia e Scantimburgo teriam defendido o prémio para Queiroz após a autora ter apoiado o ingresso dos mesmos na Academia Brasileira de Letras.[29]

O suposto 'acerto' entre os membros brasileiros do júri e Queiroz repercutiu negativamente na imprensa e na intelectualidade portuguesas. O escritor José Cardoso Pires foi bastante duro com a escolha da romancista brasileira, afirmando que "a sua obra não avaliza a exigência que caracteriza o prémio". Queiroz classificou as acusações como caluniosas, enquanto Jorge Amado e Arnaldo Niskier saíram em defesa da escritora.[29] Amado foi agraciado com o Camões no ano seguinte. Tanto Cardoso Pires, quanto Haroldo de Campos faleceram sem receber a distinção.

Segundo o Jornal do Brasil, em 1998 alguns especialistas em literatura portuguesa acreditavam que o premiado seria José Cardoso Pires, que se encontrava em coma após sofrer um derrame. O premiado, contudo, foi o professor, crítico literário e teórico brasileiro Antonio Candido. Segundo o periódico, a decisão dos jurados não foi unânime, porém, estes evitaram qualquer tipo de comentário a respeito de outros prováveis homenageados.[30] Pires faleceu em outubro daquele mesmo ano.

Premiado em 2006, o escritor José Luandino Vieira recusou o prémio alegando "razões pessoais e íntimas". Mais tarde, Luandino revelou que o facto de não editar qualquer livro há longos anos "pesou muito" na decisão de recusar o prémio. «Teria sido uma grande injustiça para os escritores que estavam a editar regularmente», disse então.[31][32]

Por ocasião da escolha de Arménio Vieira, em 2009, o Ministro da Cultura de Cabo Verde e linguista Manuel Veiga fez o seguinte comentário: «"já era mais que tempo", lamentando, porém, que Manuel Lopes, um dos maiores autores cabo-verdiano, já falecido, nunca tenha sido galardoado com um prémio "mais que merecido". "Mas é uma homenagem a toda a literatura de Cabo Verde. Desde os claridosos até aos jovens autores. Cabo Verde já merecia e Arménio Vieira também", referiu, lembrando que o prémio "conforta" todas os escritores e poetas do Arquipélago.»[33]

Em 2010, o júri escolheu o poeta brasileiro Ferreira Gullar, porém, tornou público que o nome da escritora portuguesa Hélia Correia também fora cogitado. A idade dos concorrentes serviu como critério de desempate: Gullar completaria 80 anos naquele ano, enquanto os votantes consideraram que Correia ainda "teria tempo" para ser premiada.[34] O reconhecimento da autora ocorreu em 2015.

Na cerimónia de entrega do prémio de 2017, o escritor Raduan Nassar criticou duramente o governo do então presidente do Brasil, Michel Temer. O autor também fez críticas ao Supremo Tribunal Federal e ao processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O então ministro da Cultura, Roberto Freire, reagiu atacando a fala de Nassar, de modo que recebeu vaias dos convidados presente.[35]

Em 2019, o artista brasileiro Chico Buarque foi o vencedor do Prémio Camões. Numa atitude muito criticada, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, sugeriu que não iria assinar o diploma de entrega do prémio. "A não assinatura do Bolsonaro no diploma é para mim um segundo Prémio Camões”, reagiu Chico Buarque à notícia, segundo a coluna de Ancelmo Gois no jornal O Globo.[36]

Apesar das críticas, o Prémio Camões foi saudado por intelectuais como Antônio Carlos Secchin por conferir reconhecimento a autores de renome que transitam por diferentes gêneros e estilos, além de proporcionar uma maior circularidade das obras dos mesmos entre os países lusófonos.[37]

Ver também

Referências

Ligações externas