Gastroenterite

Gastroenterite é uma inflamação do trato gastrointestinal que afeta o estômago e o intestino delgado.[8] Os sintomas mais comuns são diarreia, vómitos e dor abdominal.[1] Outros possíveis sintomas incluem febre, falta de energia e desidratação.[2][3] Geralmente os sintomas manifestam-se durante menos de duas semanas.[8] Embora por vezes seja denominada "gripe intestinal", a doença não tem relação com a gripe.[9]

Gastroenterite
Gastroenterite
Vírus da gastroenterite: A = Rotavírus, B = Adenovírus, C = Norovírus, e D = Astrovírus. As partículas virais estão à mesma escala de modo a se poder comparar dimensões.
SinónimosGripe gástrica, gripe intestinal
EspecialidadeInfectologia
SintomasDiarreia, vómitos, dor abdominal, febre[1][2]
ComplicaçõesDesidratação[2][3]
CausasVírus, bactérias, parasitas, fungos[2][4]
Método de diagnósticoBaseado nos sintomas, em alguns casos análise das fezes[2]
Condições semelhantesDoença inflamatória intestinal, má-absorção intestinal, intolerância à lactose[5]
PrevençãoLavagem das mãos, beber água potável, saneamento, amamentação[2]
TratamentoTerapia de reidratação oral (combinação de águais, sais e açúcar), fluidos por via intravenosa[2]
Frequência2,4 mil milhões (2015)[6]
Mortes1,3 milhões (2015)[7]
Classificação e recursos externos
CID-10A02.0, A08, A09, J10.8, J11.8, K52
CID-9008.8 009.0, 009.1, 558
CID-111688127370
DiseasesDB30726
MedlinePlus000252, 000254
eMedicineemerg/213
MeSHD005759
A Wikipédia não é um consultório médico. Leia o aviso médico 

A gastroenterite pode ser causada por infeções por vírus, bactérias, parasitas ou fungos.[2][4] A causa mais comum são vírus.[4] Em crianças, o rotavírus é a causa mais comum dos casos graves da doença.[10] Em adultos, os mais comuns são os norovírus e Campylobacter.[11][12] A transmissão pode ter origem na ingestão de alimentos que não foram devidamente preparados, em beber água não potável ou pelo contacto direto com uma pessoa infetada.[2] Geralmente não são necessários exames para confirmar o diagnóstico.[2]

As medidas de prevenção incluem lavar as mãos com sabonete, beber apenas água potável, saneamento e amamentar os bebés em vez de usar fórmula infantil.[2] Em crianças está recomendada a vacina contra rotavírus.[2][10] O tratamento consiste na ingestão de líquidos em quantidade suficiente.[2] Em casos ligeiros ou moderados, isto é feito com solução de reidratação oral, que consiste numa combinação de água, sais e açúcar.[2] Em bebés a ser amamentados, está recomendado continuar a amamentação.[2] Em casos mais graves pode ser necessária a administração de líquidos por via intravenosa.[2] Os líquidos podem ainda ser administrados por uma sonda nasogástrica.[13] Em crianças, está recomendada a suplementação de zinco.[2] Geralmente não são necessários antibióticos.[14]

Em 2015 ocorreram dois mil milhões de casos de gastroenterite que causaram 1,3 milhões de mortes em todo o mundo.[6][7] A doença afeta sobretudo crianças nos países em vias de desenvolvimento.[15] Em 2011, ocorreram cerca de 1,7 mil milhões de casos em crianças com menos de cinco anos de idade que causaram cerca de 700 000 mortes.[16] Nos países em vias de desenvolvimento, é frequente que as crianças com menos de dois anos contraiam seis ou mais infeções por ano.[17] A doença é menos comum em adultos, devido em parte ao desenvolvimento de imunidade adquirida.[18]

Sinais e sintomas

A gastroenterite manifesta-se normalmente através de diarreia e vómitos,[18] e menos frequentemente através de apenas um dos sintomas.[1] Podem também ocorrer cólicas abdominais.[1] Os sintomas têm normalmente início entre 12 a 72 horas depois de se contrair o agente infeccioso.[15] Quando tem origem viral, a doença desaparece normalmente ao fim de uma semana.[18] Alguns agentes virais podem estar na origem de sintomas associados como febre, fadiga, dores de cabeça e dores musculares.[18] No caso das fezes conterem sangue, é pouco provável que a causa seja viral[18] e muito provável que seja bacteriana.[19] Algumas infecções bacterianas podem estar associadas a cólicas abdominais muito intensas e podem persistir por várias semanas.[19]

As crianças infectadas por rotavírus recuperam normalmente após três a oito dias.[20] No entanto, em regiões menos desenvolvidas onde o acesso a cuidados de saúde é difícil, é comum que a diarreia persista por um período de tempo maior.[21] A desidratação é uma complicação frequente da diarreia,[22] e crianças com um grau significativo de desidratação podem apresentar teste de re-enchimento capilar lento, turgor da pele reduzido e respiração anormal. No lactente a depressão da fontanela superior é um sinal precoce de desidratação.[23] Em regiões sem condições sanitárias, é comum a ocorrência repetitiva de infecções, o que a longo prazo pode dar origem a desnutrição,[15] crescimento deficiente e atraso cognitivo.[17]

Cerca de 1% dos infectados com espécies de Campylobacter desenvolvem artrite reativa e 0,1% desenvolvem a síndrome de Guillain-Barré.[19] As infecções por Escherichia coli ou espécies de Shigella, produtoras da toxina Shiga podem dar origem à síndrome hemolítico-urémico, que se manifesta pela baixa contagem de plaquetas, insuficiência renal e baixa contagem de glóbulos vermelhos.[24] As crianças são mais predispostas a contrair a síndrome do que os adultos.[17] Algumas infecções virais podem dar origem a convulsões epilépticas infantis benignas.[1]

Causas

As principais causas da gastroenterite são os vírus, em particular o rotavírus, e a espécie bacteriana E. coli e as espécies do género Campylobacter.[15][25] Existem, no entanto, vários outros agentes infecciosos que podem causar a doença.[17] São por vezes registadas causas não-infecciosas, mas são muito menos prováveis de ocorrer.[1] O risco de infecção é maior em crianças devido à sua pouca defesa imunitária e relativa falta de higiene.[1]

Viral

Entre os vírus que se sabe estarem na origem da gastroenterite contam-se os rotavírus, os norovírus, os adenovírus e os astrovírus.[18][26] Os rotavírus são a causa mais comum da gastroenterite em crianças,[25] com taxas de incidência semelhantes nos países desenvolvidos e em desenvolvimento.[20] Os vírus são responsáveis por cerca de 70% dos episódios de diarreia infecciosa em pediatria.[13] O rotavírus é uma causa menos comum em adultos devido à imunidade adquirida ao longo da vida.[27]

Os norovírus são a principal causa de gastroenterite entre adultos na América do Norte, sendo responsáveis por mais de 90% dos surtos.[18] Este tipo de epidemias localizadas ocorre quando grupos de indivíduos passam tempo em relativa proximidade física, como em cruzeiros,[18] hospitais ou restaurantes.[1] Os indivíduos podem permanecer infectados mesmo depois da diarreia ter cessado.[18] Os norovírus são também responsáveis por cerca de 10% das ocorrências infantis.[1]

Bacteriana

Imagem de microscópio do Serotipo Typhimurium (ATCC 14028) da Salmonella enterica, ampliado 1000x e submetido a coloração.

Nos países desenvolvidos a principal causa de gastroenterite bacteriana é a Campylobacter jejuni. Metade destes casos estão associados com a exposição a aves de criação.[19] Em crianças, as bactérias são responsáveis por cerca de 15% dos casos, sendo as espécies mais comuns a Escherichia coli, Salmonella, Shigella e a Campylobacter.[13] Se determinado alimento for contaminado por bactérias e se se mantiver à temperatura ambiente durante várias horas, as bactérias não multiplicam-se e potenciam o risco de infecção dos eventuais consumidores.[17] Entre os alimentos normalmente associados com a contaminação estão a carne, marisco e ovos crus ou mal cozinhados; rebentos crus; leite não pasteurizado, queijos moles, fruta e sumos de vegetais.[28] Nos países em desenvolvimento, sobretudo na Ásia e na África sub-Sariana, a cólera é uma das principais causas de gastroenterite, sendo transmitida através da água ou alimentos contaminados.[29]

O bacilo toxigénico Clostridium difficile é também uma das causas de diarreia, o que se verifica sobretudo em idosos.[17] As crianças podem ser portadoras desta bactéria sem que manifestem sintomas.[17] Causa também diarreia entre aqueles hospitalizados e é frequentemente associada ao uso de antibióticos.[30] A diarreia causada por Staphylococcus aureus pode também ocorrer em consumidores de antibióticos.[31] A diarreia do viajante é normalmente um tipo de gastroenterite bacteriana. Os medicamentos antiácidos aparentam aumentar o risco de infecção após exposição a uma série de organismos, entre os quais a Clostridium difficile e as espécies de Salmonella e Campylobacter.[32] O risco é maior naqueles que tomam inibidores da bomba de protões do que nos que tomam anti-histamínicos H2.[32]

Parasitas

A gastroenterite pode ser provocada por uma série de protozoários, sobretudo pela Giardia lamblia, mas também por Entamoeba histolytica e pelas espécies de Cryptosporidium.[13] No total, estes agentes são responsáveis por cerca de 10% dos casos em crianças.[24] A Giardia é mais frequente nos países em desenvolvimento, mas este agente etiológico está na origem de infecções praticamente em qualquer região.[33] É, no entanto, mais comum em pessoas que tenham viajado para regiões com grande prevalência do parasita, em crianças que frequentam jardins de infância, relações homossexuais e na sequência de desastres.[33]

Transmissão

A transmissão pode dar-se através do consumo de água contaminada ou da partilha de objectos pessoais.[15] Em regiões com estações secas e chuvosas, a qualidade da água deteriora-se frequentemente durante a estação húmida, o que tem relação directa com a ocorrência de surtos.[15] Em regiões de estações temperadas, as infecções são mais frequentes durante o Inverno.[17] O uso de biberões com recipientes mal esterilizados é uma das mais significativas causas de transmissão a nível global.[15] As taxas de transmissão estão igualmente relacionadas com maus hábitos de higiene, sobretudo entre crianças,[18] em habitações sobrelotadas,[34] e em indivíduos que apresentem já sintomas de má nutrição.[17] Depois de desenvolverem imunidade, os adultos podem ser portadores de determinados patogéneos sem demonstrar quaisquer sinais ou sintomas, agindo como reservatórios de contágio.[17] Enquanto que alguns agentes, como a Shigella, são exclusivos dos primatas, outros, como a Giardia, podem contaminar uma série de animais.[17]

Não-infecciosa

Existe uma série de causas não-infecciosas capazes de provocar inflamações do trato gastrointestinal.[1] Entre as mais comuns estão: medicamentos como os anti-inflamatórios não esteroides, determinados alimentos como a lactose (naqueles que são intolerantes) ou o glúten (naqueles com doença celíaca). A doença de Crohn pode igualmente estar na origem de gastroenterites, por vezes bastante severas.[1] Pode também verificar-se o aparecimento da doença como consequência de determinadas toxinas. Entre os sintomas relacionados com a ingestão de alimentos para além das náuseas, vómitos e diarreia estão: a intoxicação por ciguatera, em consequência do consumo de peixe contaminado; a intoxicação por tetrodotoxina associada à ingestão de tetraodontídeos; e o botulismo associado à conservação imprópria da comida.[35]

Fisiopatologia

A gastroenterite define-se pela manifestação de vómitos ou diarreia causados pela infecção do intestino delgado ou grosso.[17] As alterações no intestino delgado normalmente não são inflamatórias, enquanto que as do intestino grosso são.[17] O número de patogénios necessários para iniciar uma infecção varia entre apenas um (no caso da Cryptosporidium) e 108 (no caso da Vibrio cholera).[17]

Diagnóstico

A gastroenterite é diagnosticada clinicamente com base nos sinais e sintomas do paciente.[18] Normalmente, não é necessária a determinação exacta da causa, já que não influencia o tratamento ou a gestão da doença.[15] No entanto, devem ser feitos exames às fezes quando se verifique sangue nas mesmas, quando se suspeite de intoxicação alimentar e em indivíduos que tenham viajado recentemente para países em desenvolvimento.[13] Podem também ser feitos exames de diagnóstico durante a fase de monitorização da doença.[18] Uma vez que cerca de 10% das crianças sofre de hipoglicemia, recomenda-se que para este grupo sejam verificados os níveis de glicose no soro.[23] Caso haja suspeitas de desidratação severa, devem ser analisados os níveis de eletrólitos e de creatinina.[13]

Desidratação

Uma das parte importantes na avaliação é determinar se a pessoa sofre ou não de desidratação, sendo esta normalmente dividida em três graus: leve (3-5%), moderada (6-9%) e grave (≥10%).[1] No lactente o sinal mais precoce de desidratação é a depressão da fontanela superior e a reposição de líquidos é uma urgência pois a desidratação pode ser letal em 24 horas num lactente.[36] Em crianças, os indicadores mais precisos de desidratação moderada ou grave são o enchimento capilar lento, turgor da pele reduzido e respiração acelerada.[23][37] Outros sintomas complementares, eventualmente úteis quando conjugados com os anteriores, incluem a enoftalmia, pouca actividade, ausência de lágrimas e boca seca.[1] Um fluxo urinário normal e a capacidade de ingestão de líquidos por via oral sem os vomitar de imediato são sinais tranquilizadores.[23] Os exames laboratoriais são de pouca ou nenhuma utilidade para se determinar o grau de desidratação.[1]

Diagnóstico diferencial

É necessário excluir através do diagnóstico eventuais patologias que se manifestam através de sinais e sintomas semelhantes aos da gastroenterite, como a apendicite, vólvulo, doença inflamatória intestinal, infecção do trato urinário ou a diabetes mellitus.[13] Devem também ser tidas em consideradação a insuficiência pancreática, a síndrome do intestino curto, a doença de Whipple, a doença celíaca e o abuso de laxantes.[38] O diagnóstico diferencial pode ser difícil se a pessoa apenas manifesta um dos sintomas de vómitos ou diarreia, em vez de ambos.[1]

A apendicite pode manifestar-se através de vómitos, cólicas abdominais e pequena quantidade de diarreia em 33% dos casos,[1] em contraste com a grande quantidade de diarreia que é comum nos casos de gastroenterite.[1] As infecções pulmonares ou do trato urinário em crianças podem também estar na origem de vómitos e diarreia.[1] A cetoacidose diabética manifesta-se através de cólicas abdominais, náuseas e vómitos, mas sem diarreia.[1] Um estudo demonstrou que 17% dos casos de cetoacidose diabética em crianças foram inicialmente diagnosticadas como gastroenterite.[1]

Prevenção

Percentagem de exames de rotavírus com resultados positivos, por semana de observação. Estados Unidos, Julho de 2000 até Junho de 2009.

Estilo de vida

Para a redução das taxas de infecção e dos casos de gastroenterite clinicamente relevante, é fundamental a existência de fornecimento de água não contaminada e de boas práticas sanitárias.[17] Tem-se verificado que as medidas de âmbito pessoal, como a correcta lavagem das mãos, estão na origem de uma redução até 30% na prevalência de gastroenterite, tanto nos países desenvolvidos como em desenvolvimento.[23] Os géis à base de álcool podem ser igualmente eficazes.[23] A amamentação é importante, sobretudo em regiões com más condições de higiene,[15] já que reduz quer a frequência, quer a duração das infecções.[1] Evitar comida e água contaminada é igualmente eficaz.[39]

Vacinação

Devido à eficácia e segurança demonstradas pela vacina contra rotavírus, a Organização Mundial de Saúde recomendou em 2009 que fosse disponibilizada gratuitamente para todas as crianças à escala mundial.[25][40] Existem duas versões comerciais da vacina, ao mesmo tempo que existem várias outras em fase de desenvolvimento.[40] Em África e na Ásia, estas vacinas foram capazes de reduzir a incidência de casos graves entre as crianças,[40] e nos países que colocaram em marcha um programa nacional de vacinação verificou-se o declínio das taxas de incidência e gravidade da doença.[41][42] A vacina contra rotavírus reduz também a probabilidade de contágio ao reduzir o número de infecções em propagação.[43] Nos Estados Unidos, a implementação de um programa de vacinação contra o rotavírus a partir do ano 2000 foi responsável pela diminuição de 80% do número de casos de diarreia.[44][45][46] A primeira dose da vacina deve ser administrada a crianças entre as 6 e 15 semanas de vida.[25] A vacina oral da cólera revelou ser 50 a 60% eficaz ao longo de dois anos.[47]

Tratamento

A gastroenterite é uma doença aguda e auto-limitante que normalmente não requer qualquer medicação.[22] O tratamento preferencial naqueles com desidratação leve a moderada é a terapia de reidratação oral (TRO).[24] No entanto, a metoclopramida e/ou a ondansetrona podem ser úteis nalgumas crianças,[48] e a butilescopolamina pode ser usada no tratamento de dores abdominais.[49]

Reidratação

A principal forma de tratamento da gastroenterite, quer em adultos quer em crianças, é através da reidratação. Normalmente recorre-se à terapia de reidratação oral, embora possa ser necessária a administração intravenosa nos casos mais graves ou quando haja perda ou alteração de consciência por parte do paciente.[50][51] Os produtos de terapia oral à base de hidratos de carbono complexos (por exemplo, os que são feitos a partir de trigo ou arroz) podem ser mais eficazes do que aqueles à base de açúcares simples.[52] As bebidas com níveis particularmente altos de açúcar, como os refrigerantes ou os sumos de fruta, não são recomendadas para crianças com idade inferior a 5 anos, já que podem contribuir para o agravamento da diarreia.[22] Caso não seja possível preparar meios adequados de terapia de reidratação oral, pode ser usada apenas água.[22] Caso seja necessário, pode-se recorrer a uma sonda nasogástrica para administrar líquidos a crianças pequenas.[13]

Dieta

Recomenda-se que lactentes continuem a ser amamentados de forma regular, e que crianças alimentadas com fórmula infantil retomem a alimentação imediatamente depois da reidratação com TRO.[53] Geralmente não são necessárias fórmulas isentas ou com baixo teor de lactose.[53] Durante os episódios de diarreia, as crianças devem manter a sua dieta regular, devendo apenas evitar alimentos ricos em açúcares simples.[53] A dieta BRAT (bananas, arroz, puré de maçã, tostas e chá) já não faz parte das recomendações, uma vez que não contém nutrientes suficientes e não apresenta benefícios em relação à dieta regular.[53] Tem-se verificado que alguns probióticos podem ajudar a reduzir tanto a duração da doença como a frequência da defecação.[54] Os produtos lácteos fermentados, como o iogurte, podem também apresentar alguns benefícios.[55] Os suplementos de zinco aparentam ser eficazes tanto no tratamento como na prevenção da diarreia entre crianças nos países desenvolvidos.[56]

Antieméticos

Os antieméticos podem ajudar no tratamento de vómitos em crianças. A ondansetrona é relativamente eficaz, e a administração de uma única dose associa-se à menor necessidade de administração intravenosa de soro, a menos hospitalizações e à redução dos vómitos.[57][58][59] Metoclopramida também pode ser útil.[59] No entanto, o uso de ondansetrona pode estar associado também a uma maior taxa de re-hospitalização em crianças.[60] Caso haja supervisão e aprovação médica, a administração do fármaco pode ser feita por via oral.[61] O dimenidrinato, embora reduza os vómitos, não aparenta ter benefícios clínicos significativos.[1]

Antibióticos

Geralmente, os antibióticos não são usados no tratamento da gastroenterite, embora sejam por vezes recomendados no caso dos sintomas serem particularmente graves[62] ou caso se suspeite ou tenha isolado uma causa bacterial.[63] No caso de serem usados antibióticos, é preferível o uso de um macrólido, como a azitromicina, em relação a fluoroquinolonas devido à maior resistência antibiótica destas últimas.[19] A colite pseudomembranosa, normalmente causada pelo uso de antibióticos, pode ser resolvida com a interrupção da administração do antibiótico em causa, substituindo-o por metronidazol ou vancomicina.[64] Entre as bactérias que reagem positivamente ao tratamento estão a Shigella,[65] Salmonella typhi,[66] e as espécies de Giardia.[33] Nos casos de espécies de Giardia ou Entamoeba histolytica, o tratamento com tinidazol é superior e recomendado em relação ao metronidazol.[33][67] A Organização Mundial de Saúde recomenda o uso de antibióticos em crianças novas que apresentem diarreia com sangue e febre.[1]

Agentes antimotilidade

A medicação antidiarreica possui um risco teórico de causar complicações, e embora a experiência clínica tenha mostrado que isto seja improvável,[38] o uso destes fármacos é desencorajado em pessoas com sangue na diarreia ou diarreia associada a febre.[68] A loperamida, um análogo opiáceo, é frequentemente usada no tratamento sintomático da diarreia.[69] No entanto, o seu uso não é recomendado em crianças, já que pode penetrar através da barreira hematoencefálica ainda não desenvolvida, e provocar uma intoxicação. O salicilato de bismuto, um complexo insolúvel de bismuto trivalente e de salicilato, pode ser usado em casos leves a moderados,[38] embora a intoxicação seja teoricamente possível.[1]

Epidemiologia

Esperança de vida corrigida pela incapacidade para a diarreia por cada 100.000 habitantes em 2004.

Estima-se que ocorram anualmente entre três a cinco mil milhões de casos de gastroenterite à escala mundial,[24] afectando sobretudo crianças e habitantes de regiões em vias de desenvolvimento.[15] Em 2008, a doença causou a morte de 1,3 milhões de crianças idade igual ou inferior a cinco anos,[70] a maior parte registada nos países mais pobres do mundo.[17] Mais de 450 000 das mortes nesta faixa etária são provocadas por rotavírus.[71][72] A cólera está na origem de cerca de três a cinco milhões de casos e mata anualmente cerca de 100 000 pessoas.[29] Nos países em desenvolvimento, é frequente as crianças com idade inferior a dois anos contraírem anualmente seis ou mais infecções que resultem em casos clinicamente relevantes.[17] A prevalência é menor em adultos, em parte devido ao desenvolvimento de defesas imunitárias.[18]

Em 1980, a gastroenterite, independentemente da causa, foi a responsável por 4,6 milhões de mortes infantis, a maior parte das quais nos países em desenvolvimento.[64] O número total foi reduzido para 1,5 milhões de mortes anuais no ano 2000, devido em grande parte à introdução da terapia de reidratação oral.[73] Nos Estados Unidos, as infecções que estão na origem da gastroenterite são a segunda infecção mais comum, atrás apenas da constipação, e dão origem a cerca de 200 a 375 milhões de casos de diarreia aguda[18][17] e a cerca de dez mil mortes anualmente,[17] sendo 150 a 300 destas mortes em crianças com idade inferior a cinco anos.[1]

História

O primeiro uso da designação "gastroenterite" ocorreu em 1825.[74] Antes disso, era conhecida nos meios clínicos como febre tifóide ou "cholera morbus", entre outros, ou popularmente como "gripe intestinal" ou qualquer outra designação arcaica equivalente para diarreia aguda.[75]

Impacto social e económico

A gastroenterite é o principal motivo para cerca de 3,7 milhões de consultas médicas por ano nos Estados Unidos[1] e 3 milhões em França.[76] Nos Estados Unidos, estima-se que o custo económico da gastroenterite seja de 23 mil milhões de dólares por ano.[77]

Investigação

Estão em fase de desenvolvimento uma série de vacinas contra a gastroenterite. Por exemplo, vacinas contra a Shigella e a Escherichia coli enterotoxigénica (ETEC), duas das principais causas bacterianas de infecção à escala mundial.[78][79]

Noutros animais

A gastroenterite em gatos e cães tem origem em muitos agentes infecciosos em comum com os seres humanos. Os organismos mais comuns são a Campylobacter, Clostridium difficile, Clostridium perfringens e a Salmonella.[80] Os sintomas podem igualmente ter origem num vasto número de plantas tóxicas.[81] Alguns dos agentes são específicos de determinadas espécies. O coronavírus da gastroenterite transmissível afecta os suínos, manifestando-se através de vómitos, diarreia e desidratação.[82] Acredita-se que seja introduzido nos porcos através de aves selvagens, não havendo qualquer tratamento específico disponível.[83] embora não seja transmissível ao ser humano.[84]

Referências

  • Este artigo foi inicialmente traduzido, total ou parcialmente, do artigo da Wikipédia em inglês cujo título é «Gastroenteritis».
Bibliografia
  • Dolin, [edited by] Gerald L. Mandell, John E. Bennett, Raphael (2010). Mandell, Douglas, and Bennett's principles and practice of infectious diseases 7th ed. Philadelphia, PA: Churchill Livingstone/Elsevier. ISBN 0-443-06839-9